quinta-feira, 19 de outubro de 2017

Borracha do tempo




O tempo tudo leva,
Tudo tira,
Tudo apaga,
Somente o esquecimento nos afaga.

Se isso fosse assim, que bom que era!
Dormia todo o dia descansado,
Todos os anos só tinham primavera,
Os meus invernos ficavam no passado.
Se isso fosse verdade, maravilha!
Um coração virgem cada dia,
Não ter o meu fechado numa ilha,
Não ter tristeza, somente a alegria.
Se tal acontecesse, que fantástico!
Os mortos desapareciam num instante,
A dor não era feita de elástico,
Que  estica mas nunca está distante.
Se o tempo fosse uma ferramenta,
Usada para o ido apagar,
Não tinha esta saudade que se alimenta
Do tempo que vai passando, sem passar.

O tempo tudo leva,
Tudo tira,
Tudo apaga,
Somente o esquecimento nos afaga.

sexta-feira, 13 de outubro de 2017

Sinos fendidos



Vão tocando os sinos
A  mesma canção
Chamando os  meninos
Para a oração.
Hoje não me apetece,
Não quero rezar,
Pois nenhuma prece
Me muda o azar.

Estou farto  de Pai-Nossos,
Das Avé Maria ,
São iguais os almoços ,
A mesma monotonia.
Já basta de Glória,
Ou Atos de Contrição,
Nada dá a vitória
Na luta do coração.

O padre acena
À porta da igreja,
Mas a minha cena
Não é Assim Seja.
Beatas rezando
Por todas as almas,
Estou-me borrifando
Com todas as calmas.
Já são tantos anos
Pedindo, implorando...
E os desenganos
Não passam orando.

quarta-feira, 5 de abril de 2017

Perdição



Perco-me de cada vez que te procuro,
Sinto-me perdido cada vez que te descubro,
É na distância que me sinto mais seguro,
É no esquecimento que tolhido eu  me cubro.
Perco-me nessa tua inexistência,
Como estrela, na galáxia, já extinta,
Brilhando, sendo vista no futuro,
Pequena luz que é só vista no escuro.
E fico na penumbra que é a sombra
Da loucura que existiu e preencheu
Todo o universo embrenhado no teu corpo,
A via láctea escondida  sob o céu.

Perco-me por ser  teu ...

Ainda há memórias que restam  escondidas,
Projetos desenhados sem medidas,
Construções que não cabem no papel,
Um  mundo construído em carrossel,
Pequenas utopias encantadas,
Roçando-se nas nossas ilusões,
Ou são quimeras pelo tempo inventadas,
Brincando com as nossas emoções?

Ainda há sonhos que permanecem acordados
Alheios aos ponteiros do destino,
Aguardam por um dia, enganados,
Ter  um encontro de pleno desatino.

Perco-me nessa busca infindável,
De me encontrar em ti todos os dias,
Sabendo que a ausência é inevitável

E a perdição é feita de agonias.

quarta-feira, 4 de janeiro de 2017

Ocultos

Ocultam-se os pensamentos
Escondidos da razão,
Brincando às escondidas
No real da ilusão.
Quem vem lá?
Pergunta o medo
Armado em valentão,
Temendo que o seu segredo
Se descubra num arremedo
De malvada confissão.
É tão grande a confusão!
Mistura-se o que se perde
No ganhar que não se guarda
Quem não perde, só aguarda
Que se apague o coração.
Quem vem lá? pergunta a medo
A pacífica existência
Que se acomoda no tempo
Temendo que a inocência
Tenha desejos revoltos
Abanando os alicerces

Dos medos que não estão soltos.