quinta-feira, 7 de fevereiro de 2013

Silêncio Calado



Deixei de ouvir as palavras escritas no computador. Deixei de as escrever e elas ficaram sem som.
Já não se ouve a dor, o sofrimento, a angústia das palavras que magoam, o riso daquelas que alegram, a tristeza daquelas que choram. Não preciso mais de esconder o coração nas palavras ou descobri-lo em confissões indesejadas. Está livre para não sentir. Não se ouvem os sons que magoam; sons de ciúme, sons da distância, sons que se ouviam com a tua falta (alguns deles eram lágrimas a correrem para dentro dos olhos), sons da consciência a impor-se ao pecado. Resta o ecrã em branco, silencioso. Nem sequer se ouvem os murmúrios dos soluços, ou o riso escarninho da razão. Ela ganhou-nos. Foi mais forte que a insegurança da nossa relação moribunda à nascença, como feto abortado sem licença, aborto espontâneo por falta de útero onde germinasse e crescesse, feto sem som e como tal sem vontade. Já não se ouvem os gritos mudos da minha paixão alucinada e cega; gritos-frases que te escrevia à sexta-feira, gritos-poemas que te continuo a escrever. Não se ouvem os dias a passar longe de ti. É um silêncio que oprime, que vai apertando a solidão como uma amarra, não a deixando soltar-se, partir para outros lados, navegar noutras almas que se amam sem serem correspondidas. Como nós… Dizes-me que é mentira, que o que eu sinto se corresponde em ti, e eu te digo que apenas se corresponde nas palavras e por isso elas se calam, cansadas de serem usadas por nós dois. Cansadas de serem só palavras que dizem sentimentos sem os sentirem; palavras de amor não amadas. Palavras-letras marionetas, que dançavam com a nossa vontade, ora se deitando por volúpia, ora se levantando com vergonha de se terem despido. Palavras-beijo que viviam na memória e se perderam no correr dos dias, por falta de alimento, por se esquecerem como eram quando estavam abraçadas aos nossos lábios. Palavras-sonho que viveram na nossa imaginação, que se cansaram de ser sonho e se transformaram em palavras-utopia. Calaram-se todas as palavras, deixando em seu lugar um silêncio-estátua, imóvel, um silêncio calado.
Christian de La Sallette